Um ano … Um ano depois de um renascer …
Hoje é um dos dias mais felizes da minha vida. Um dia tão esperado de mais uma vitória.
Tudo isto começou quando eu ainda era ainda tão pequena. Cuidados especiais, cuidados para pessoas crescidas em alguém que tinha apenas cinco anos. Mas ao mesmo tempo uma conversa de alguém de sete ou oito anos.
Fui forçada a crescer rápido, a entender como as coisas no mundo dos adultos funcionavam, mas foi um crescimento para o meu bem. Então lutei, dia após dia, sem nunca desistir.
A vida de uma criança que corria tudo, virou uma vida de alguém que mal se mexia. Não conseguia andar e muito menos correr, não conseguia falar muito tempo, não conseguia ser como os outros. Mas havia uma coisa que eu sabia que eles não tinham e eu tinha. E não! Não era uma doença, mas sim um sorriso e uma valorização de vida que mais ninguém sabia ter.
Foram aniversários em camas de hospital, foram festas de família ausente, foram jantares de turma adiados, foram passeios cancelados. Mas uma vida Feliz, não me perguntem porque me considerava assim feliz, era-o porque o era.
Até que o momento em que desanimei foi o avanço da doença. Ficar agarrada e completamente dependente a uma garrafa de oxigénio. Aí mais uma vez tive de crescer, encarar como um passo de melhora, um passo que me faria prolongar a vida e isso era o que eu mais queria.
Chegado o momento de falar do transplante. A decisão mais difícil da minha vida.
Decidir entre: entregar-me a médicos e ter esperança que me salvassem dentro de horas, ou então não fazer e ter essa mesma esperança que duraria mais uns dias. Parece cruel, mas era esta a realidade.
Não hesitei, decidi salvar a minha Vida, dentro de um bloco durante horas. Sabia que na vida tinha sido muito feliz. Mas que merecia algo melhor, algo que me fizesse ter tempo de agradecer a todos os que sempre me acompanharam, ajudaram e consolaram.
Fui perguntando a alguns o que achavam de arriscar, todos diziam com medo “Vai Filipa. Aceita”, apesar de eu sentir trémulas, as vozes de cada um mas ao mesmo tempo confiantes. E arrisquei, arrisquei sem medos e com confiança.
Despedir de todos, mas de força especial, porque a ocasião assim o exigia. Deitada na cama, com um sorriso, um simples acenar de mão e “até já”.
Entrei num mundo incerto, mas um mundo de novas perspectivas. Ia salvar-me, era esse o meu principal pensamento.
Não sei o que aconteceu entretanto, mas sei como saí de lá. Saí uma nova Filipa, soube o que era respirar. Por mais que queira, por palavras, descrever aquele momento, não consigo. Foi algo tão especial, senti mesmo a minha salvação.
A minha Vida começou de novo. Com cuidados, como sempre, com receios de alguma rejeição, mas com algo muito importante, ainda mais vontade de viver.
Coisas tão simples, mas que eu já não fazia á anos. Momentos que nunca esquecerei junto daqueles que de mim trataram em Lisboa. Da família, dos amigos que sempre do meu lado estiveram. Aqueles abraços inexplicáveis de saudade e de carinho.
Agora respiro, mas foi preciso ter uma base sólida de confiança e de muita coragem. Mas também admito que se não tivesse fibrose quistica, não seria tão feliz, na medida em que não saberia o valor que a vida tem no nosso dia-a-dia. Não saberia valorizar o que os amigos fazem por nós. Amigos esses que dão quase uma vida a alguém. Não a sua vida física, mas o seu tempo, o seu ombro, o seu alento, a sua sabedoria e o quanto me ensinaram.
Amigos que desde o primeiro dia, quiseram-se aproximar, descobrir quem eu era. Amigos que mesmo ainda não me conhecendo, pensavam que teriam de me ajudar, que tinham essa “missão”. E foi assim que consegui os melhores amigos do mundo. Foi assim que venci parte da minha vida, foi assim que consegui ter força para me salvar, coragem para decidir a minha vida. A todos, muito obrigada.
Aos doentes de Fibrose, apenas digo “Lutem, não se deixem vencer pela doença.”. Não olhem para mim como alguém que consegue tudo, olhem sim para como eu consegui vencer tanta coisa na minha vida. Não tenham receio de dizer que têm Fibrose Quistica, não hesitem em explicar o que é a doença. E digam “Eu consigo, eu sou capaz”.
Eu consegui graças a cada um de vocês, graças a cada estrelinha minha do céu.
É assim que vos quero demonstrar que é preciso agarrar a oportunidade de voltar a nascer, e eu agarrei a minha e vou aproveitá-la.